16/06/2009

Diários de Jack Kerouac

Lendo Diários de Jack Kerouac (1947-1954) que ganhei de presente (valeu fafito!).

Domingo, 22 de junho de 1947
Outro pensamento que ajuda um escritor enquanto trabalha - deixe-o escrever seu romance "do jeito que ele gostaria de ver um romance escrito". Isso ajuda muito a libertar você dos grilhões da dúvida de si mesmo e o tipo de falta de autoconfiança que leva a revisões demais, cálculos demais, preocupação com "o que os outros vão pensar". Olhe para seu próprio trabalho e diga: "Este é um romance segundo o meu coração!". Porque vai ser isso de qualquer jeito, e esse é o problema - é a preocupação que deve ser eliminada pelo bem da força individual. Apesar de todo esse conselho despreocupado, eu mesmo avancei devagar, hoje, mas não fui mal, trabalhando na versão final do capítulo. Estou um pouco enferrujado. Ah, que grande palavrório eu poderia escrever esta manhã sobre meu temor de que não saiba escrever, de que seja ignorante e, pior de tudo, um idiota tentando fazer algo que não tenho a menor condição de fazer. Está na vontade, no coração! Pro inferno com essas dúvidas podres. Eu as desafio e cuspo nelas. Merde!

Ao que parece, estes questionamentos que assolavam Kerouac no período em que escrevia seu primeiro romance tiveram peso fundamental em definir características marcantes de sua linguagem literária, como a espontaneidade e a fluidez.

Eu costumava pensar que o combate à auto-censura em qualquer campo artístico deveria ser um exercício constante. Mas, até que ponto o "preocupar-se em não se preocupar" não acaba apenas alterando o foco da fonte de preocupação? A dificuldade da tarefa se assemelha à da meditação - simplesmente não pensar - sem nem mesmo pensar em não pensar. A meu ver, o cenário ideal é um apurado domínio da técnica, capaz de representar imediatamente e com fidelidade todas as nuances de sentimentos e idéias emitidos, e a renúncia a quaisquer ruídos racionais. Uma ponte direta entre a emoção e a obra.

Certamente que isso não é nada fácil e eu mesmo perdi uns 15 minutos escrevendo o parágrafo acima, que não vou nem reler, sob o risco de querer mudar tudo.

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